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sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

 
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Talvez te lembres de que, uma vez, há muito tempo, também viajei pelo Oriente; foi durante a minha lua-de-mel com a Krisztina. Viajávamos entre árabes e em Bagdad fomos convidados de uma família árabe. É gente de grande nobreza, e tu, que tens viajado pelo mundo, sabes bem isso. A sua altivez, o seu orgulho, o seu comportamento, o seu carácter apaixonado e a sua tranquilidade, a disciplina dos seus corpos e a consciência dos seus movimentos, os seus jogos e o brilho dos seus olhos, tudo reflecte uma nobreza de longa data, aquela nobreza antiga, quando o homem, no caos da criação, despertou pela primeira vez para a sua dignidade humana. Segundo uma teoria, a raça humana surgira por esses lugares, nas profundidades do mundo árabe, no princípio dos tempos, antes de aparecerem os povos, as tribos e as civilizações. Talvez por isso sejam tão orgulhosos. Não sei. Não entendo dessas coisas... Mas entendo algo do orgulho, e do mesmo modo como as pessoas, sem sinais distintivos exteriores, sentem que são do mesmo sangue e da mesma raça, senti durante aquelas semanas no Oriente que todos ali eram senhores, até os cameleiros sórdidos. Como te disse, morávamos na casa de uma família indígena, numa casa que parecia um palácio; éramos convidados de uma família árabe, por recomendação do nosso embaixador. Essas casas frescas, brancas... conhece-las? O pátio grande, onde decorre, sem cessar, a vida da família e da tribo, é, ao mesmo tempo, mercado, parlamento e o lugar do templo... Essa deambulação e desejo ávido de jogar que transparece em todos os seus movimentos. Essa inércia imponente e agressiva, atrás da qual se esconde o prazer de viver e a paixão, como a serpente entre as pedras imóveis, batidas pelo sol. Uma noite receberam convidados em nossa honra, convidados árabes. Até essa noite fomos tratados de um modo quase europeu, o nosso anfitrião era juíz e contrabandista, um dos homens mais ricos da cidade. Os quartos de hóspedes eram mobilados com mobília inglesa, a banheira era de prata pura. Mas essa noite vimos algo diferente. Os convidados chegaram depois do pôr-do-sol, todos eram homens, senhores e os seus criados. O fogo já ardia no meio do pátio e emanava um fumo cáustico, o fumo de esterco dos camelos que irritava os olhos. Todos se sentaram em silêncio em redor do fogo. A Krisztina era a única mulher entre nós. Depois trouxeram um cordeiro, um cordeiro branco, o dono da casa tirou a faca e, com um movimento que é impossível de esquecer, matou-o... Esse movimento não se pode aprender, esse movimento oriental que remete para aquela época em que o acto de matar tinha também um sentido simbólico, religioso, significava a união com algo essencial, com a vítima. Foi assim que Abraão ergueu a faca sobre Isaac no momento do sacrifício, com esse movimento imolaram os animais nos templos antigos diante do altar, do ídolo e do símbolo da divindade e também com esse movimento decapitaram São João Baptista... É um movimento muito antigo. No Oriente oculta-se nas mãos de todos os homens. Talvez o homem tivesse nascido com esse movimento, quando se separou daquele ser intermédio que foi, entre o animal e o ser humano... segundo a antropologia, o homem nasceu quando tinha a capacidade de dobrar o polegar e assim podia agarrar a arma e a ferramenta. Mas é possível que tudo começasse com a sua alma e não com o polegar; não posso saber isso... O árabe matou o cordeiro e naquele momento, esse homem velho, envolto num albornoz branco, sobre o qual nem uma única gota de sangue caiu, era como um grande sacerdote oriental no acto do sacrifício. Mas os seus olhos brilhavam, ele rejuvenesceu por um instante, e reinava um silêncio profundo em redor. Estavam sentados à volta do fogo, olhavam para o acto de matar, o brilho da faca, o corpo do cordeiro que se debatia, o sangue que jorrava em jacto e todos tinham os olhos resplandecentes. E nesse momento percebi que esses homens ainda vivem próximos do acto de matar, o sangue é-lhes uma coisa familiar, e o brilho da faca é um fenómeno tão natural para eles, como o sorriso de uma mulher ou a chuva.


Sándor Márai in As velas ardem até ao fim, 1999.



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